Foto: Giovanni Silva |
A Câmara de Vereadores de Blumenau realizou, na noite desta quarta-feira (17), audiência pública para debater sobre o Plano Nacional de Educação (PNE), que vigorará durante o período de 2024 a 2034, e também a Conferência Nacional de Educação (CONAE) - edição 2024, e o conflito de propostas em contraposição às leis que protegem a criança. A audiência foi realizada no Plenário da Casa E atendeu ao Requerimento 537/2024, de autoria da vereadora Silmara Miguel (PSD). Ao final da audiência pública, foram votadas e aprovadas uma moção de repúdio às questões ideológicas do Plano Nacional de Educação que foi elaborado na edição de 2024 do CONAE, e uma moção de apelo ao Congresso Nacional para que os representantes em Brasília rejeitem o Plano Nacional da Educação da forma como está.
Além da vereadora autora, o debate contou com as presenças dos vereadores Jovino Cardoso (PL), Diego Nasato (Novo), Gilson de Souza (União Brasil) e Alexandre Matias (PSDB), além da deputada estadual Ana Campagnolo (PL), representantes de outros deputados federais, estaduais e vereadores, da representante da Coordenadoria Regional de Educação do Governo do Estado, do Fórum Municipal de Educação, da Secretaria Municipal de Educação, entre outras autoridades representantes de órgãos e entidades.
Discussão
A coordenadora do Fórum Municipal de Educação, Mônica Letícia Deschamps, explicou que o fórum é composto por representantes de 20 instituições e órgãos e se reúne mensalmente para acompanhar, avaliar e fazer articulações para efetivar o Plano Municipal de Educação. Ela contou que no ano passado iniciaram as conferências municipais, regionais e também nacionais para debater o Plano Nacional de Educação para os próximos 10 anos, e que existem duas representantes de Blumenau participando a nível nacional.
Contou que os professores de educandários e CEIs foram convidados a trazerem contribuições na Conferência Municipal, que aprovou alguns tópicos que foram encaminhados para discussão nas outras esferas. Ressaltou que os participantes não entraram em discussões políticas e partidárias. Explicou que o Plano Nacional de Educação está no Ministério da Educação, seguirá para Câmara dos Deputados e depois será sancionado pelo Presidente. “O Plano prevê a instituição do Sistema Nacional de Educação, mas cada município e estado tem autonomia definir metas e estratégias próprias. Após homologado o plano nacional, teremos a tarefa de rever o nosso plano municipal, com base no plano nacional, no ano que vem, para fazer alterações de acordo com as legislações”, explanou Mônica.
Adriana Laurentino, representando Associação das Escolas Cristãs de Educação, apontou que houve falhas de divulgação da conferência nos municípios, além de denúncias sobre a existência de um documento que já veio pronto. Afirmou que no rascunho do PNE existe a obrigatoriedade da matrícula de crianças a partir de zero anos e aberrações sobre desigualdades e direitos humanos, trazendo, por exemplo, o homeschooling como algo a ser combatido. Também falou sobre o Sistema Nacional de Educação (SNE), proposto por projeto aprovado no Senado, que aguarda votação na Câmara, e está contido dentro do PNE. Disse que, na prática, estados e municípios perderão autonomia garantida na Constituição Federal e que o PNE será centralizado nas mãos de cinco comissões formadas por indicação. Alertou que os deputados federais devem saber os riscos do que está contido tanto no PNE quanto no projeto que implanta o Sistema Nacional de Educação, pois não discutem melhorias na educação.
O presidente da Comissão de Educação na Câmara dos Deputados, o deputado Nikolas Ferreira, enviou um vídeo dizendo que o documento, de 180 páginas, não tem a ver com educação e sim com instrumentalização da educação em prol das ideias de esquerda. Disse que está aprovando audiências públicas e seminários para a discussão do tema. Afirmou que o SNE coloca o estado no controle tanto da educação privada quanto da pública. “Estamos trabalhando para que isso não passe dessa forma, pois o PNE vai ditar os próximos 10 anos da educação no país. Conversei com o deputado Arthur Lira e ele me garantiu que o SNE não passará no Plenário. Tanto o PNE quanto o SNE deverão passar antes pela Comissão de Educação que tem a competência de discutir esses temas”.
Jesiel Anacleto, professor universitário, mestre e doutor em Filosofia, disse que leu o documento e sua principal ressalva é a respeito do forte viés ideológico. Apontou que os artigos deixam claro a discussão de ideias progressistas e opinou que a educação não deve ser arena para disputas políticas e ideológicas, pois a finalidade é a formação científica dos sujeitos bem como a formação cidadã nos limites da Constituição Federal. Defendeu que na Conferência seria necessário ouvir as vozes divergentes, pois todos deveriam ter os mesmos direitos e oportunidades de apresentar suas ideias. Disse que o documento possui ataques e críticas ao homeschooling e escolas militares, e defendeu a liberdade dos pais em escolher a melhor escola para os filhos. Criticou a falta de rigor técnico do documento e finalizou dizendo que ao professor cabe o domínio dos conteúdos científicos, e a formação moral dos sujeitos é responsabilidade dos pais.
Guilherme Schelb, procurador da República, especialista em infância, segurança e educação, disse em vídeo enviado para exibição durante a audiência que de acordo com a Constituição Federal, a base da sociedade é a família e é dever do poder público protegê-la. Disse que a responsabilidade civil pelos danos causados por crianças e adolescentes é de seus pais e não dos professores ou ativistas. Disse que cabe à escola o ensino de matérias escolares, desenvolvimento intelectual e cognitivo, mas os valores morais são prerrogativas da família.
O vereador Diego Nasato falou sobre o Ranking PISA, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, que não foi citado no PNE, e que compara 81 países na área da educação e mostra que o Brasil precisa avançar muito em todas as áreas avaliadas. Também avaliou que há um viés ideológico no documento. “Ao mesmo tempo que promove a diversidade, não entendo por que combate a diversidade de formas de pensar e de educar os filhos, pois procura proibir o ensino domiciliar e se posiciona contra as escolas cívico-militares, além de proibir a participação de entidades religiosas na gestão escolar, por exemplo”. Defendeu o ensino domiciliar, em especial no ensino fundamental, e disse que o PNE critica a PEC do teto de gastos, mais uma prova de que o plano versa sobre política e não sobre educação.
A vereadora proponente, Silmara Miguel, que também é presidente da Comissão de Educação da Câmara de Vereadores, enalteceu o trabalho feito na educação em Blumenau, mas relatou uma denúncia de doutrinação aos alunos por parte uma professora da rede estadual. Também apontou os dados do Ranking PISA 2023, dizendo que são inaceitáveis. Sobre o PNE, criticou os artigos que propõem a desmilitarização das escolas, falando dos bons resultados dos educandários cívico-militares, onde os professores não fazem doutrinação. Afirmou que o Conae teve preocupação social e democrática, mas não deu espaço para pessoas a favor do agronegócio, educação domiciliar, pautas de direita, que não concordam com ideologia de gênero ou linguagem neutra, entre outras questões. Disse que se o PNE for aprovado o município não poderá mais decidir retirar livros impróprios das salas de aula, como ocorreu recentemente com o livro “O avesso da pele”, que narrava ato sexual entre dois adolescentes. Assinalou que a lei aponta que é direito e dever de todos lutar pela educação das crianças, e criticou a segregação de pessoas. Ao final defendeu que é dever da família educar, e que cabe à escola ensinar.
O deputado Ismael dos Santos, membro da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, enviou um vídeo em que explica o que é o PNE e dizendo que neste ano está em jogo, através do SNE, a tentativa de materializar um sistema educacional único, com o controle sobre alocação dos recursos do setor e também o controle da ideologia a ser propagada nas escolas públicas e privadas. Apontou que o sistema irá retirar autonomia dos estados e municípios. Afirmou que não irá aceitar essa proposta de fazer a escola uma criadora de massa ideológica e que irá lutar por uma educação de inclusão, equidade e de qualidade.
A deputada estadual Ana Campagnolo destacou que o PNE afronta a primazia da família na educação das crianças, e disse que no estado e nos municípios catarinenses esse modelo educacional proposto pelo governo federal não tem espaço. Afirmou que o patrono da educação, Paulo Freire, foi alfabetizado em casa, e disse que não é difícil oferecer uma educação melhor em casa do que nas escolas públicas, já que a educação no Brasil é uma das piores do mundo. Disse que os pais, ainda que não sejam profissionais excepcionais e formados em pedagogia, ainda provavelmente seriam melhores do que a maioria dos pedagogos que temos hoje. Afirmou que após aparelharem universidades, a mídia, e todas as instituições fora das Casas Legislativas, o movimento de esquerda agora tira de dentro das Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores as decisões sobre educação. Falou sobre a ocupação ideológica das escolas, apontando que é uma marca de regimes autoritários e totalitários. Disse que no documento, quando se refere à diversidade, pretende-se disseminar um espírito anti-cristão, e assinalou que a maioria da população brasileira e catarinense é cristã. Falou de dois projetos de lei de sua autoria, um deles que garante o direito aos pais de vedarem a participação dos filhos em atividades pedagógicas de teoria de gênero no estado, e outro que busca impedir crianças e adolescentes de terem acesso a documentos pornográficos e obscenos. Sugeriu que os projetos sem copiados na cidade.
Erlédio Pering, representando a deputada federal Ana Paula Lima (PT), que já foi Secretário Municipal de Educação, explicou que a CNE serve para ouvir as pessoas, e que não havia sido convocada há 2 anos, conforme era previsto. Disse que 60 entidades que compõem a educação brasileira participaram da organização dessa Conferência. Explanou que o Ministério da Educação agora tem a tarefa de elaborar o PNE, assinalando que ele não é o documento da Conae. Disse que o PNE possui metas para a educação nos próximos 10 anos, e estratégias para que o país as alcance, como por exemplo garantir a alfabetização de todas as crianças até 8 anos de idade, o que não foi alcançado nos últimos 10 anos. Apontou que o PNE será apresentado à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, que democraticamente irão votá-lo. Defendeu a citação do teto de gastos no documento, pois disse que essa estratégia foi responsável por levar brasileiros à fome. Ao final, ressaltou que as diversidades existem e pediu que os pais não passem mensagens aos seus filhos criminalizando educadores e professores.
Rosane Martins, do instituto Mães do Amor, explicou que a entidade luta pelos direitos das pessoas LGBTQIAP+. Afirmou que essas pessoas existem, pagam impostos, mas não são defendidas quando há discussões na Casa Legislativa. Afirmou que no Plano Municipal de Educação foram retiradas todas as palavras que se referiam à diversidade, gênero, segurança e integridade dessas pessoas LGBTQIAP+. Disse que são ataques sucessivos da Casa Legislativa contra essas pessoas e ressaltou que a política deve ser feita para todos. Pediu que sejam assegurados os direitos de todas as famílias na Casa Legislativa e questionou em nome de quais famílias está se pedindo que se desconsidere o que foi incluído no documento do Conae. Afirmou que entende que se há a inclusão da palavra diversidade no documento, é porque de fato existe a exclusão de pessoas. Opinou que tudo no país virou “doutrinação”, e que professores não podem defender o direito de todos à educação na sala de aula, independente da orientação sexual, porque estariam doutrinando os alunos. Afirmou que dessa forma estão sendo retirados os direitos fundamentais.
Joana Zucco falou em nome do Sintraseb, e opinou que o PNE deveria ter sido debatido no momento da Conferência Municipal da Educação, em outubro do ano passado. Disse que o debate democrático é feito por pessoas que possuem conhecimento para a construção de uma educação pública de qualidade, igualitária, inclusiva e laica para todos. Questionou sobre a participação dos vereadores nas reuniões do Fórum Municipal de Educação e também na Conferência Municipal. Disse que a Casa sempre questiona o trabalho do profissional da educação, e não faz o mesmo com outras categorias profissionais. Defendeu a formação dos professores para essa discussão e criticou a falta de debate na Câmara sobre o sucateamento das escolas e CEIs. Falou sobre o papel social da escola, defendendo que deve ser um espaço de diversidade e inclusão e dizendo que a sociedade não é composta por um único modelo. Pediu que o tema seja tratado na Comissão de Educação e que sejam consultados os profissionais da área e o Sintraseb. Afirmou que o PNE foi construído a muitas mãos e deve ser respeitado assim como os trabalhadores da educação do município, estado e país.
Leonardo Aluízo, representando o Conselho de Pastores do Estado de Santa Catarina, disse que a Conferência foi pouco divulgada e assinalou que ninguém é contra os professores. Questionou por que os pais não são convidados para os encontros do Fórum Municipal de Educação. Destacou trechos do documento, dizendo que são ideológicos e políticos. Fez um apelo para que a sociedade esteja presente nas discussões das políticas públicas para ajudar a construir uma escola mais justa e igual. Também pediu que os pais sejam a principal influência na vida dos filhos.
Em seguida foi aberta a palavra para inscritos que estavam presentes em plenário. Bárbara, representante do Fórum Municipal de Educação, falou sobre a participação da família na instituição de ensino. Disse que as APPs e Conselhos Escolares estão abertos, citando sua experiência, como profissional da educação, com a falta de participação das famílias.
Rafael Venturelli – representante do Deputado Jessé Lopes (PL), disse que o Plano Nacional de Educação apresenta um viés ideológico, criticando diversos movimentos por suposta doutrinação para com as crianças nas escolas. Ainda citou Olavo de Carvalho. Diego Vieira, presidente da associação de famílias educadoras de Santa Catarina, disse que o Plano Nacional de Educação é uma afronta aos direitos humanos, contra a liberdade educacional e contra o direito das famílias para com seus filhos. Afirmou que o PNE apresenta viés ideológico.
Liliane, mãe de aluno, disse que o Plano Nacional de Educação exclui o pais e a família, não prioriza o que é direito e não prevê os deveres de educadores, cidadãos e responsáveis em preparar as crianças para o mundo. Dalva da Silva falou sobre as dificuldades dos professores. Comentou sobre a meritocracia na escola e disse os alunos não estão saindo da escola sabendo ler e compreender textos. Falou que existem professores que estão lutando para mudar a situação. Ainda destacou a importância da família.
A vereadora mirim suplente Katherine Grahl Castanho falou que tem observado uma grande diferença no desempenho escolar de crianças e adolescentes que têm auxílio e incentivo da família e os que não têm. Incentivou que os pais participem da vida estudantil e os estudantes permitam que isso aconteça.
Lenilso Silva, que já ocupou uma cadeira na Casa enquanto suplente de vereador, falou sobre diversidade e disse que sua família também existe e deve ser contemplada no PNE. Disse que gostaria de ver sendo discutida a segurança das crianças, condições de trabalho para os profissionais e recursos para a cidade. Ainda falou da importância de trazer o antagonismo para essa discussão e defendeu que o plano inclua os segmentos historicamente excluídos.
Mario Kato falou sobre a importância das conferências e disse que o CONAE é a legítima expressão de trabalhadores, gestores e pais. Também explanou a importância de incluir as minorias nas discussões de políticas públicas, além dos debates sobre bullying e sexualidade. Yonara da Silva Souto disse que gostaria que os professores se ativessem no ensino das matérias curriculares. Lamentou que não pôde participar do Conae e falou sobre a insegurança nas escolas.
Fábio Junior Santos, pai de um aluno que foi vítima do atentado à creche Cantinho Bom Pastor e sobreviveu, parabenizou e reverenciou todos os professores e abordou sobre o respeito entre alunos e professores.
Em seguida a vereadora proponente, Silmara Miguel, esclareceu sobre a presença dos vereadores no Conae, a ausência de outros deputados estaduais no debate desta noite, destacando a presença constante dos vereadores nas escolas e CEIs na busca de melhorias para os educandários.
Mônica Letícia Deschamps, oradora principal da audiência pública, esclareceu que o Fórum Municipal de Educação tem 40 participantes, citando alguns representantes. Falou sobre a organização da Conferência Municipal em outubro de 2024 e a divulgação do evento, ressaltando a grande participação de profissionais da educação e poucos familiares. Defendeu os profissionais da educação, dizendo que a grande maioria faz um trabalho de excelência.
Ao final da audiência, a vereadora Silmara Miguel reforçou a qualidade dos profissionais da educação de Blumenau e fez encaminhamentos. Foram votadas e aprovadas uma moção de repúdio às questões ideológicas do Plano Nacional de Educação que foi elaborado na edição de 2024 do Conae, e uma moção de apelo ao Congresso Nacional para que os representantes em Brasília rejeitem o Plano Nacional da Educação da forma como está. Também informou que seu gabinete irá encaminhar para tramitação na Câmara cópia dos projetos de lei citados pela deputada Ana Campagnolo.